É tudo uma questão do olhar. Dá pra ser otimista ou pessimista, dá pra enxergar luz ou sombra. Dá pra olhar pra um talo de brócolis ou pra casca de um inhame, por exemplo, e ver lixo. Ou então, dá pra enxergar pratos deliciosos a serem preparados. Regina Tchelly sempre prefere olhar pra coisas com aquela boa dose de positividade. Foi nessas que nasceu o Favela Orgânica, projeto lindo desenvolvido pela pernambucana que nos ensina a olhar pros alimentos de forma integral, utilizando tudo, inclusive aquelas partes que sempre vão pro lixo.

“Quando eu ainda morava em Serraria, no interior de Pernambuco, a impressão que dava era que a gente sempre soube gerir o nosso consumo”, ela conta. É que por lá funciona assim: planta, colhe, descasca, cozinha, usa a casca pra fazer outra delícia, o talo pra mais uma e, pronto: quando você vê, nada foi pro lixo. Quando ela chegou no Rio, para trabalhar como doméstica, ficou impressionada com a quantidade de comida que era desperdiçada. Os números vieram pra assustar ainda mais: mais de 30 milhões de pessoas morrem de fome a cada ano. Quando ela viu, estava lá, autodidata que só, cozinhando e criando maravilhas com o que sobrava dos alimentos e sendo aplaudida por aqueles que mais conheciam e entendiam de boa comida.

Foi nesse momento que ela sentiu que deveria espalhar esse conhecimento para mais e mais pessoas. Em tempos onde a relação de consumo é pautada pelo desperdício, nada mais importante do que conscientizar as pessoas sobre cada etapa do ciclo da alimentação: começando do planejamento das compras até o preparo e descarte dos alimentos. Sua primeira oficina teve investimento próprio de R$140 e dez participantes. Hoje, o projeto dessa pernambucana cheia de carisma e alegria, já rodou o Brasil e o mundo todo e já ganhou prémios como o Aliança Empreendedora, o GlobalShift Festival, o SEBRAE Mulher de Negócios, o World Cuisine Summit, o Trip Transformadores, entre tantos outros.

“Cozinha é o ambiente da troca e hoje em dia estamos perdendo isso”, ela diz, “A gente reata a vontade de cozinhar junto, de aproximar as pessoas, a minha missão é dar vida ao alimento que as pessoas ignoram, fazendo releituras de receitas e introduzindo esses elementos no dia a dia”. Fazendo o que ama -e o que sabe- Regina quer modificar a relação das pessoas com os alimentos, evitando o desperdício, cuidando do ambiente e mostrando que é, sim, possível acabar com a fome. “Não se trata de reaproveitar o alimento, a coisa é aproveitar ele todo”, ela diz.

O Favela Orgânica atua em três frentes: através das oficinas que trazem à tona o aproveitamento total dos alimentos e o consumo consciente; através da produção de cardápios alternativos para eventos em geral; e através da capacitação profissional para que estabelecimentos aproveitem ao máximo os alimentos que compram. Desse jeito, pouco a pouco, Regina vai deixando sua pegada pelo mundo e mostrando que é bem melhor focar na luz do que a sombra. Ou então, enxergar que a casca de abóbora, o talo do agrião, a casca do inhame ou o talo do brócolis não são lixo. Pelo contrário: eles podem virar pratos deliciosos como um risoto de casca de abóbora, um tabule de talo de agrião, ou um pastelzinho de casca de chuchu e creme de abóbora, ou ainda um pão de casca de inhame com alecrim acompanhado de pasta de berinjela com talo de toioba. É que é aquilo: é tudo uma questão de escolher como olhar…

Que tal uma receita de Brigadeiro de Casca de Banana da Regina?